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Estadão: “STF insulta os brasileiros” ao suspender multas de R$ 8,5 bilhões da antiga Odebrecht

O Estado de S. Paulo critica decisão de Dias Toffoli de suspender multas da Novonor na Operação Lava Jato

Em um duro editorial publicado neste domingo (5), o jornal O Estado de S. Paulo criticou a decisão do ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), que suspendeu o pagamento de multas pela Novonor (antiga Odebrecht) no âmbito da Operação Lava Jato.

“Surto coletivo”

O artigo de opinião intitulado “O STF insulta os brasileiros” coloca em dúvida a narrativa de Toffoli e insinua que a medida tomada pelo ministro invalida as investigações da Lava Jato, as delações de executivos e o trabalho da mídia. O editorial declara que, segundo Toffoli, “tudo o que viram, leram e ouviram a respeito do monumental esquema de corrupção” nunca ocorreu.

O Estadão critica a postura de Toffoli, que, segundo o jornal, tenta “mostrar à sociedade que as investigações da Lava Jato, as revelações da imprensa profissional e as confissões de centenas de executivos não passaram de uma conspiração”.

A permissão concedida por Toffoli também possibilita que a Novonor revise os termos dos acordos de leniência que foram estabelecidos com a PGR, CGU e AGU. O editorial questiona essa oportunidade, levando em conta que a empresa já confessou os delitos e se comprometeu a saldar as multas.

No ano de 2016, a Odebrecht selou um acordo de leniência, se comprometendo a desembolsar R$ 8,5 bilhões (equivalente a US$ 2,5 bilhões naquele período) no Brasil, Estados Unidos e Suíça. O objetivo era a interrupção de todos os processos vinculados à construtora e à Braskem, que é uma das companhias do conglomerado.

Eis a íntegra do editorial do Estadão:

No que depender do Supremo Tribunal Federal (STF), em particular do ministro Dias Toffoli, falta muito pouco para que milhões de brasileiros passem a acreditar que, talvez, no auge da Operação Lava Jato, tenham vivido uma espécie de surto coletivo. Tudo o que viram, leram e ouviram a respeito do monumental esquema de corrupção envolvendo as maiores empreiteiras do País durante os governos do PT, a despeito das inúmeras provas fornecidas pelos próprios acusados, aceitas como perfeitamente válidas em todas as instâncias judiciais ao longo de anos, simplesmente não aconteceu – e, pior, que as empresas envolvidas foram vítimas de uma sórdida conspiração da Lava Jato.

Em setembro do ano passado, o ministro Dias Toffoli decidiu liminarmente anular todas as provas que consubstanciaram o acordo de leniência da Odebrecht, hoje rebatizada como Novonor. O despacho com tintas imperiais “foi uma decisão exagerada e desequilibrada que, numa só canetada, colocou abaixo o trabalho de anos de várias instituições estatais”.

Quase três meses depois, o mesmo Dias Toffoli voltou a pôr sua pena sobre o papel em que decidiu reescrever a história recente do País. Com mais uma infeliz canetada, o ministro, aproveitando o recesso de fim de ano do Poder Judiciário, suspendeu o pagamento da multa de R$ 10,3 bilhões prevista no acordo de leniência firmado entre a J&F e as autoridades brasileiras.

Dias Toffoli parece seguir imparável no que se revela como uma autoatribuída missão de mostrar à sociedade que as investigações da Operação Lava Jato, as revelações da imprensa profissional e as confissões de centenas de executivos envolvidos em tramoias com agentes públicos – sem falar na extraordinária soma em dinheiro que tiveram de devolver ao erário – não passaram de uma conspiração urdida nos corredores do Poder Judiciário e do Ministério Público Federal em Curitiba.

Na quinta-feira passada, foi a vez de o ministro suspender o pagamento da multa de R$ 6,8 bilhões da Odebrecht (em valores corrigidos), sob quase os mesmos argumentos que o levaram a decidir favoravelmente ao pleito da J&F. Dias Toffoli foi convencido pela equipe de defesa da Odebrecht de que seus executivos teriam sofrido “chantagem institucional” para assumir a autoria dos crimes e firmar os acordos de leniência.

É curiosa, para dizer o mínimo, a interpretação exótica que o ministro Dias Toffoli faz da suposta coação, ou “chantagem”, de que teriam sido vítimas os executivos da Odebrecht. Em primeiro lugar, são necessárias doses generosas de candura ou boa vontade para acreditar que uma das maiores empresas privadas do País, assessorada, portanto, por uma equipe de advogados de primeira linha, poderia ser forçada a assinar o que quer que fosse. Ademais, que constrangimento ilegal ou abuso de autoridade seriam esses que, ora vejam, só serviriam para sustar os ônus do acordo de leniência, mantendo íntegros os bônus do pacto? Não faz sentido.

Se firmados à força, sob chantagem, todos os acordos devem ser anulados em seus termos, inclusive os que beneficiam as empreiteiras, como a possibilidade de voltar a participar de licitações públicas e o fim do acordo de não persecução criminal. No limite, que os processos voltem à estaca zero, os erros cometidos pela força-tarefa da Operação Lava Jato sejam saneados e os implicados voltem a responder por seus atos.

Tudo é ainda mais estupefaciente quando se observa que, até hoje, nenhuma das decisões monocráticas do ministro Dias Toffoli sobre os acordos de leniência foi submetida ao crivo do plenário do Supremo. Ocioso esperar que seus pares cassem essas liminares, algo que raramente acontece na Corte. Mas os outros dez ministros poderiam ao menos dar um sinal à sociedade de que o Supremo ainda é um tribunal colegiado, como diz a Constituição.

Na abertura do ano Judiciário, no dia 1º passado, o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, comemorou o fato de que “as instituições funcionam na mais plena normalidade” hoje. Resta a pergunta: para quem?

 

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