Neste ano, ao menos 129 blocos de carnaval de rua optaram por não desfilar na cidade de São Paulo, com muitos deles sendo grupos menores e da periferia. Os representantes citam a escassez de recursos financeiros, a falta de organização da prefeitura para facilitar o evento e o curto intervalo entre a licitação para a escolha do patrocinador da prefeitura e o próprio evento.
Emerson Boy, fundador do Bloco Jegue Elétrico, existente há 24 anos, conta que desde o início o bloco sempre saiu nos quatro dias de carnaval, porém, no ano passado, foi preciso diminuir um dia para viabilizar o desfile. Em 2024 a ideia era continuar com os três dias, mas também foi preciso desistir de mais um dia. “Eu inscrevi o bloco em três dias e pensei em desistir de dois, mas consegui desistir de só um. Tudo por questão financeira. E porque o edital definindo quem ia bancar o carnaval demorou para sair. Por isso ficamos indeciso para conseguir apoios, correr atrás de patrocínios. É tudo muito fechado, mal organizado por essa prefeitura”, reclama.
O carnavalesco alega que há muitas dificuldades em colocar um bloco na rua e ressalta que a organização não tem retorno financeiro. “Nós fazemos um esforço para trabalhar pelo carnaval da cidade, trazer esses momentos de felicidade para os foliões, para o povo de São Paulo, para ocupar as ruas e humanizar as ruas com alegria. O carnaval é uma festa muito grande para a cidade, por isso estamos tristes, porque não recebemos nenhum apoio”.
Responsável pelo maior bloco da zona leste, o Bloco Tatuapé, Gustavo Leman diz que espera conseguir fazer o desfile, mas ainda está muito difícil garantir. Neste ano o bloco completa dez anos, mas a falta de patrocínio está se mostrando como um grande impeditivo para a comemoração. “O bloco é o maior da zona leste, é o único megabloco decentralizado, reúne 50 mil pessoas, mas por sermos da zona leste acabamos sendo desinteressantes para as grandes marcas. Por isso, para nós, é sempre um pouco mais difícil, mas este ano foi o pior”.
Leman reclamou que os grandes protagonistas, que são os blocos e os organizadores, ficam apenas com as dificuldades para fazer o carnaval acontecer nas ruas da cidade. “A gente faz uma grande festa linda para a cidade que ganha muito, gera emprego, movimento, muito dinheiro, mas nós que estamos fazendo isso acontecer não conseguimos encaminhar as coisas. Isso é triste porque cada bloco tem sua importância junto com a pessoa física que o criou, além de representar muito para quem o frequenta”, reforçou.
Apesar das dificuldades, Leman diz acreditar que conseguirá fazer o desfile de dez anos, já que uma marca local resolveu apoiar o projeto, após a indicação de uma rede de comerciantes da área. “Obviamente isso não garante o desfile, não tranquilizou a ponto de termos certeza de que ele vai ocorrer da forma que se deve”.
O membro do Fórum de Blocos de São Paulo José Cury disse ser difícil fazer a contagem exata de todos os desistentes. Segundo ele, as desistências começaram a acontecer logo após a inscrição em outubro, já que muitos grupos se inscrevem mesmo sem ter certeza de que vão obter dinheiro suficiente para viabilizar o bloco.
“Muitos dizem que o bloco não foi competente para conseguir o patrocínio, mas a realidade é que a gente não tinha nem certeza de quem era o patrocinador da prefeitura. Assim as marcas ficam segurando até a licitação sair. E se ganham não patrocinam os blocos porque a verba já está comprometida. De certa forma a prefeitura prejudica a relação comercial dos blocos. E blocos maiores não precisam fazer muita coisa para conseguir, porque as marcas se interessam”, disse.
Prefeitura
Segundo a prefeitura, o Carnaval de Rua 2024, que começa neste sábado (3) e vai até o dia 18 de fevereiro, tem número recorde de blocos confirmados, com 536 desfiles, 16% a mais do que no ano passado, e está com toda a infraestrutura organizada para receber os mais de 15 milhões de foliões esperados para este ano.
O patrocínio geral será da Ambev, que venceu a licitação ao apresentar o lance de R$ 26,6 milhões no pregão realizado pela prefeitura no dia 16 de janeiro. Os valores servem para cobrir os custos da prefeitura com a realização do evento. No caso dos blocos, o patrocínio é individual.
“Os blocos captam diretamente os patrocínios com as empresas. É bom deixar claro que não é a prefeitura que faz o pagamento para os blocos do carnaval de rua. Os blocos são autônomos, independentes, e o recurso que eles buscam, e sempre buscaram, foi direto do privado. Agora, se o privado resolve não patrocinar, aí a prefeitura não tem o que fazer”, disse o prefeito Ricardo Nunes.
Ainda assim, a prefeitura criou um plano de fomento para que os blocos com mais tradição na cidade tenham um incentivo a mais. A administração vai aportar R$ 2,5 milhões para 100 blocos (R$ 25 mil para cada) como forma de incrementar as atividades dos grupos que atuam na festa carnavalesca.
Segundo as informações da prefeitura, em 2023, 213 blocos cancelaram seus desfiles, enquanto neste ano foram 129. “Lógico que num evento desse tamanho, com centenas de blocos participando, pode ter um ou outro que desista Se algum bloco ou outro desiste, aí é um problema único e exclusivamente dele, de uma organização dele. A gente gostaria que não desistisse”, afirmou Nunes.