
O ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Celso de Mello, publicou um artigo em que rebate críticas à condenação da cabeleireira Débora dos Santos, de 39 anos, presa por sua participação nos atos de 8 de janeiro de 2023. No texto, intitulado “O caso do batom da golpista”, o ex-decano do STF classificou a ré como “golpista” e afirmou que sua “conduta é imperdoável”.
“Punição não é por batom”, afirma Celso de Mello
Em sua argumentação, Celso de Mello considerou “totalmente falaciosa (e absolutamente divorciada da realidade do processo penal contra ela instaurado) a afirmação de que a punição a 14 anos de prisão se deveu, unicamente, ao fato de a ré haver passado batom em uma estátua”.
A referência diz respeito à estátua da Justiça, localizada em frente ao prédio do Supremo, onde Débora foi flagrada escrevendo a frase “perdeu, mané”, uma alusão a uma declaração do ministro Luís Roberto Barroso em 2022. A pichação foi usada como uma das evidências para a denúncia feita pela Procuradoria-Geral da República (PGR), aceita por unanimidade pela 1ª Turma do STF.
Mello ressaltou que “a pichação, no caso, foi apenas um dos inúmeros elementos das múltiplas imputações penais formuladas contra referida condenada, a quem foram atribuídas práticas criminosas gravíssimas em concurso material (CP, art. 69), o que justifica, ante o que dispõe o Código Penal, a soma de cada um dos crimes perpetrados por seu autor (critério do cúmulo material das infrações delituosas)”.
“Não há perdão para quem atenta contra o regime democrático”
O tom adotado por Celso de Mello foi semelhante ao de votos que proferia quando integrava o STF: enfático, com várias exclamações, e carregado de simbolismo institucional. Em um dos trechos mais fortes do artigo, o ex-ministro sentencia: “não há perdão para quem atenta contra o regime democrático”.
A declaração reforça o posicionamento de parte do Judiciário que considera os atos de 8 de janeiro como uma ameaça real às instituições brasileiras, justificando punições severas aos envolvidos, mesmo quando não há provas de violência direta por parte dos réus.
A seguir, o texto do ex-ministro, sem reparos:
“O CASO DO BATOM DA GOLPISTA …
A resposta penal do Estado foi severa , exemplar e proporcional à extrema gravidade do comportamento da condenada , considerados os diversos crimes por ela cometidos, entre os quais os delitos de golpe de estado (CP, art. 359-M) , de abolição violenta do Estado democrático de Direito (CP, art. 359-L) e de associação criminosa armada (CP, art. 288, parágrafo único), além das infrações de dano qualificado (CP, art. 163, parágrafo único, ns. I, III e IV) e de deterioração de patrimônio tombado (Lei n. 9.605/98, art. 62, n. I) !
É totalmente falaciosa (e absolutamente divorciada da realidade do processo penal contra ela instaurado) a afirmação de que a punição a 14 anos de prisão se deveu, unicamente, ao fato de a ré haver passado batom em uma estátua !!!
Não, a pichação, no caso, foi apenas um dos inúmeros elementos das múltiplas imputações penais formuladas contra referida condenada, a quem foram atribuídas práticas criminosas gravíssimas em concurso material (CP, art. 69), o que justifica, ante o que dispõe o Código Penal, a soma de cada um dos crimes perpetrados por seu autor (critério do cúmulo material das infrações delituosas).
É sempre importante relembrar que não há perdão para quem atenta contra o regime democrático !
Ações criminosas contra o Estado democrático de Direito TÊM consequências extremamente graves , que se projetam contra quem incide em comportamentos sediciosos , vulneradores da ordem constitucional !
“Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade” ! É o que prevê o artigo 29 do Código Penal brasileiro !
Japona, farda ou trajes civis, qualquer que seja o gênero (cis ou trans) , idade (a partir de 18 anos de idade), confissão religiosa, posição social ou financeira ou condição político-funcional ou hierárquica ou atividade profissional (como no caso da condenada) não conferem imunidade penal a quem, atrevidamente, transgredir os fundamentos da democracia constitucional !!!
É simplesmente imperdoável a conduta criminosa de quem pretendeu desrespeitar o resultado legítimo de uma eleição presidencial transparente, democrática e honesta !
Em regimes de democracia constitucional , como o que vige plenamente no Brasil, o Presidente da República é sucedido pela escolha popular majoritária , em votação livre e independente, jamais, porém, por golpes de Estado , como criminosamente tentaram aqueles envolvidos em trama sórdida que agora sofre a repulsa enérgica do ordenamento jurídico de nosso País!
O legado de perversão moral e de subversão político-institucional deixado pela cúpula golpista atinge, frontal , direta, pessoal e duramente, no plano penal, aqueles (os invasores de 08 de janeiro de 2023) que se dispuseram a seguir, movidos por irresistível pulsão totalitária, os corifeus do golpe , cujo estímulo caracterizou-se , com o auxílio de outros agentes e partícipes, por seus perigosos discursos de caráter sedicioso , impregnados de profundo e irracional sentimento de ódio e disseminadores de mensagens falsas ou veiculadores de dolosa e fraudulenta distorção da realidade !
Aos criminosos, a punição, respeitada , sempre, a garantia constitucional do “devido processo legal” (tal como se registrou neste caso) ! Aos delinquentes, a imposição da pena, que constitui a resposta jurídica do Estado ao “mal injusto” cometido por seu autor , vale dizer, ao crime praticado pelo infrator !
O JUIZ , “atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima” (CP, art. 59) , e observado o critério trifásico a que alude o art. 68 do Código Penal , IMPORÁ ao condenado , na sentença que proferir, a PENA que julgar adequada e proporcional à gravidade do delito , em quantidade que repute
necessária e suficiente para reprovação e prevenção do crime .
Ações criminosas têm consequências de ordem penal ! Práticas criminosas autorizam julgamentos condenatórios e legitimam a imposição de sanções penais , ainda que severas, desde que se respeitem – como no caso desta condenada se respeitaram – os postulados constitucionais que informam e dão substância à cláusula do “devido processo legal” !
Essa a admonição , severa e grave, que se faz “sine ira ac studio”, vale dizer, “sem animosidade nem parcialidade”, dirigida “à turba anônima e à multidão sem nome” (“sine nomine vulgus”) que , ao criminosamente invadir em 08 de janeiro de 2023 a sede constitucional dos Três Poderes, dessacralizou os símbolos majestosos da República e do Estado democrático de Direito !!!”
