
Nos processos que tramitam no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre os atos do dia 8 de janeiro, o ministro Alexandre de Moraes estabeleceu um critério que tem preocupado os advogados dos réus: somente as testemunhas indicadas pela acusação são intimadas oficialmente pela Corte. As testemunhas arroladas pelas defesas, por outro lado, devem ser levadas diretamente pelos advogados, sem intimação prévia.
Essa decisão tem sido interpretada como uma forma de limitar a atuação da defesa, especialmente em um contexto de ações penais que envolvem acusações graves de tentativa de golpe de Estado após as eleições presidenciais de 2022. A abertura da ação penal contra o chamado “núcleo central” da suposta trama golpista, que inclui o ex-presidente Jair Bolsonaro, marca o início da fase de instrução processual, etapa que prevê a oitiva de testemunhas e coleta de provas.
Críticas da defesa e da DPU
Cinco advogados que atuam em processos relacionados ao caso relataram ao jornal Folha de S.Paulo que a ausência de intimações formais pode inviabilizar depoimentos importantes. A situação levou a Defensoria Pública da União (DPU) a contestar formalmente a prática.
“Tem-se, de fato, um tratamento desigual entre acusação e defesa, uma vez que a exigência de apresentação de testemunhas vem pesando sobre as defesas em geral, mesmo quando indicam servidores públicos para serem inquiridos”, afirmou o defensor público Gustavo Zortéa da Silva, em manifestação ao STF.
O ministro Alexandre de Moraes, porém, rejeitou a solicitação da Defensoria e manteve a regra: “as testemunhas arroladas deverão ser apresentadas pela defesa em audiência, independentemente de intimação”.
Moraes restringe depoimentos e veta testemunhas abonatórias
Além de exigir que a defesa leve suas testemunhas no dia da audiência, Moraes também vetou o depoimento oral de testemunhas abonatórias — aquelas que atestam a boa conduta e reputação do réu. Segundo o ministro, “os depoimentos delas ‘deverão ser substituídos por declarações escritas, até a data da audiência de instrução’”.
Esse formato processual está previsto nas decisões que abrem as ações penais relacionadas ao caso e determina ainda que as testemunhas da defesa sejam ouvidas antes do réu.
STF sustenta decisão com base no Código de Processo Civil
Em nota oficial, o STF justificou a conduta com base no artigo 455 do Código de Processo Civil: “há previsão legal para que a parte intime a testemunha sem necessidade de intimação judicial”. O plenário da Corte já rejeitou, por unanimidade, pedido de nulidade processual com base nessa questão.
Segundo três ministros do STF, que falaram sob anonimato à Folha, embora o procedimento não seja habitual, seria um “antídoto válido contra as defesas que tentam arrastar o processo por longos períodos”.
Moraes adotou outro padrão em caso sem ligação com 8/1
Apesar da rigidez nos processos ligados ao 8 de janeiro, Moraes adotou postura diferente no processo contra o deputado João Carlos Bacelar (PL-BA), acusado de peculato. Nesse caso, o ministro determinou a intimação urgente de testemunhas da defesa, acolhendo o pedido feito pelos advogados do parlamentar.
Listas de testemunhas incluem Lula, Dino e o próprio Moraes
Com o início da fase de instrução, as defesas apresentaram nomes de peso como testemunhas. A defesa de Filipe Martins, ex-assessor da Presidência, incluiu 29 pessoas, entre elas o próprio Alexandre de Moraes e Eduardo Tagliaferro, seu ex-assessor no TSE.
Já os advogados de Rodrigo de Azevedo, tenente-coronel do Exército, indicaram o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ministro Flávio Dino. A defesa de Marcelo Camara pretende ouvir delegados da Polícia Federal que atuaram nas investigações.
Acusação mantém lista enxuta de testemunhas
A Procuradoria-Geral da República (PGR) listou seis testemunhas comuns a todos os réus: os ex-comandantes das Forças Armadas Marco Antônio Freire Gomes (Exército) e Carlos Baptista Junior (Aeronáutica), o empresário Éder Balbino, o governador Ibaneis Rocha, e os ex-integrantes da Polícia Rodoviária Federal e do Ministério da Justiça, Clebson Vieira e Adiel Pereira Alcântara.
O Código de Processo Penal limita a oito o número de testemunhas por parte, mas o juiz pode autorizar exceções dependendo da complexidade do caso ou da quantidade de acusados.