
STJ Abre Precedente Polêmico ao Autorizar Retirada de Gênero de Documentos
Em uma decisão considerada inédita, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) autorizou, na terça-feira (6), a retificação de registro civil para excluir a indicação de gênero, permitindo que uma pessoa seja oficialmente registrada com identidade de gênero neutra.
A decisão foi unânime e abre um novo precedente jurídico, mesmo sem haver legislação específica sobre o tema. O caso julgado envolveu uma pessoa que, mesmo após tratamento hormonal e cirurgias, optou por não se identificar nem como homem nem como mulher e solicitou judicialmente a remoção total da indicação de gênero nos documentos oficiais.
Decisão Baseada em Princípios de Dignidade e Autoidentificação
A relatora, ministra Nancy Andrighi, defendeu a concessão do pedido com base no direito à dignidade da pessoa humana e na liberdade de identidade pessoal:
“Não estava bem no primeiro sexo, nem no segundo. Concluiu que também não era aquilo que emocionalmente sentia no coração”, afirmou Andrighi.
O argumento foi seguido por outros ministros, que reforçaram a importância de proteger a saúde mental e o direito à autoidentificação.
Ainda assim, a decisão levanta dúvidas sobre os limites da legislação civil brasileira, que ainda se fundamenta em modelos binários de sexo e gênero, previstos em documentos oficiais e diversos sistemas públicos e privados.
Mudança Ainda Não Tem Efeito Imediato nos Cartórios
Apesar da repercussão, a decisão não cria uma nova categoria de gênero nem muda automaticamente os procedimentos dos cartórios, que continuam dependendo de autorização judicial caso a caso.
Sem uma lei específica, a medida acaba por judicializar a questão da identidade de gênero, transferindo ao Judiciário decisões que caberiam ao Legislativo.
Impactos Práticos e Jurídicos Ainda Incertos
A decisão foi comemorada por grupos ligados à diversidade de gênero, mas também gerou questionamentos sobre seus efeitos práticos.
Entre os temas em aberto estão possíveis consequências em áreas como previdência, saúde pública, estatísticas oficiais e políticas de gênero, que tradicionalmente utilizam a categorização binária para formular ações e distribuir recursos.
Além disso, críticos argumentam que o Judiciário tem avançado em decisões que alteram aspectos fundamentais da legislação civil sem a devida discussão parlamentar, o que pode gerar insegurança jurídica.
Embora represente uma flexibilização do conceito de identidade civil, a medida ainda está longe de resolver as contradições legais existentes ou de trazer clareza sobre como o Estado e as instituições privadas lidarão com a omissão de gênero em registros oficiais.