
Ao contemplar “Quatro personagens e um causo sistemático”, vislumbro uma alegoria silenciosa do nosso existir: há-nos sempre quatro facetas — o herói, o vítima, o espectador e o narrador — entrelaçadas num enredo maior que nós, tecido por rotinas, silêncios, cumplicidades e escolhas inconscientes.
O herói ergue-se na ilusão da ação, sem ver que o seu papel exige tanto sofrimento quanto glória;
A vítima sustenta-se no peso da injustiça, chave mestra para despertar empatia ou alimentar ressentimento;
O espectador guarda-se no limiar da indiferença, acreditando-se isento, quando na verdade sustenta o sistema com seu olhar passivo;
E o narrador, por fim, detém o poder derradeiro — aquele que molda a narrativa, decide o que contar, como contar, e o que silenciar.
E eis que o causo sistemático é menos um conto de personagens do que um espelho: refletimo-nos em todos estes papéis, num ciclo que se renova a cada gesto esquecido, a cada palavra não dita, a cada omissão voluntária.
A verdadeira revolução não está em banir um papel, mas em reconhecer que somos eles — e, ao mesmo tempo, escolher conscientemente o que narrar, para que a história que vivemos possa transformar-se.
Tacito Loureiro
Filósofo pantaneiro




