Desde sempre, cada geração complementando os ensinamentos que haviam aprendido da geração anterior, com a sua própria experiência, tudo transmitido por mães e pais, para filhos e filhas, tudo que tinham vivenciado no tempo em que desfrutaram, temporariamente, da vidinha no Pantanal.
A mãe de minha mãe e o pai do meu pai ensinou o que daqui aprendeu…
Da mãe de sua mãe e do pai do seu pai!
Vivemos sobre estes mares de capim e água, só cortamos e usamos árvores que já não vivem mais, que como nós, já cumpriram seu tempo por aqui, ficam verdes enquanto sustentam nosso teto, já que as nuvens, o sol, a lua e as estrelas são partes de nosso telhado.
Aprendemos a conviver com o calor de rachar, quando parece que temos um sol para cada um, lembrando do tempo do vento Sul, que atravessa tudo até chegar aos ossos, cada tempo com seu vento, quente ou frio, a lembrança que um vem depois do outro, nos faz sobreviver ao imaginar uma média entre ambos esses longínquos limites.
Dizem que o pantaneiro é ocioso, por ficar muito tempo na rede, como ensinam, nossos irmãos indígenas: “- Não é porque estamos na rede, que estamos parados…”
Aliás, como ficar parado, dando de mamar ao ócio, com nuvens de mosquitos dia e noite, porvinhas ao amanhecer, e uma miríade de mutucas sempre a nos impedir de ficar estáticos.
Cumpre lembrar dos baratões descomunais e das caranguejeiras onipresentes, a assombrar e expulsar neófitos mais frágeis, amaldiçoando a terra que produz tais monstros, que os moradores locais consideram inofensivos…
No Pantanal damos nomes aos bichos , não como os colonialistas britânicos divulgam para animais selvagens da África, sempre melosos visando humanizá-los, os pantaneiros os nomeiam para batizá-los como parentes, e sempre é mais fácil apelidar os humanos com eventuais semelhanças com animais, portanto buscamos, muito pelo contrário, sempre animalizar os trejeitos humanos.
Homens e animais, alimentam e são alimentados pelo Pantanal, cuidam uns dos outros, afinal estamos aqui cumprindo um lapso de tempo, e devemos aceitar o calor e o frio, a sede da seca e a umidade das cheias, a luminosidade dos dias e a escuridão da noite seguinte.
Quando a sequidão domina, na areia que queima os pés, cumpre lembrar da cheia, quando a umidade rói essas mesmas extremidades, embranquecendo a pele e empretecendo as unhas, e nos diferenciando definitivamente dos carcanhá vermeio do Planalto.
Falam que o Pantanal é um santuário ecológico, em realidade nós pantaneiros nos achamos, junto com bichos , árvores, capins e águas, como construtores e cuidadores de toda esta beleza mas, desde que esse termo urbano “santuário ” foi disseminado, a realidade nua e crua é que nos tornamos um sanitário séptico dos moradores e cultivadores dos planaltos circundantes…
E que aproveitando-se de circunstâncias que eles mesmos causaram, começaram somente a buscar subterfúgios e projetos para se apropriarem desta natureza que pretendem monetizar, desvalorizando e escondendo o secular trabalho humano que ajudou a erigir esta tão monumental e sustentável catedral: O Pantanal.
Seria o Pantanal uma obra de um Governo Central? Sem nenhuma dúvida, o distante Reino de Portugal, ouvindo a Universidade de Coimbra e seus mestres em Geopolitica e Geoestratégia, idealizaram um triangulo de defesa formado por São Pedro D’el Rey, Vila Maria e Albuquerque assegurando aos pósteros, a integridade do Pantanal.
Mas e nestes tempos atuais? É possivel acreditar que, por aqui o poder Central só apareceu para estrategicamente nos dividir entre dois tipos de estrutura governamental Regional, facilitando a diáspora dos moradores tradicionais.
E seguimos nessa mesma trilha, pois o noticiário nos dá conta, que devemos aguardar o que sairá da determinação do Superior Órgão Judicial, impondo novas normas legais aos diferentes poderes dos governos regionais, só nos restando clamar com muita humildade, que quando se pretende ser Universal, cabe valorizar a cultura e os valores do próprio Local.
O Pantanal expõe mas não impõe, e os caminhos benéficos do passado, indicam no presente, o melhor futuro.
Tens a pretensão de ser universal? Pinta a tua própria aldeia!
Armando Arruda LacerdaPorto São Pedro